Texto baseado na Introdução do livro “Sobre a Reconstrução do Significado: uma Análise Epistemológica e Hermenêutica da Prática Clínica”, de Marilene Grandesso (2000)
Por Letícia Oliveira Rodrigues
Grandesso (2000), na introdução de seu livro “Sobre a Reconstrução do Significado: Uma Análise Epistemológica e Hermenêutica da Prática Clínica”, começa a nos contar sobre sua própria trajetória dentro da psicologia clínica e como essas experiências produziram inquietações e questionamentos importantes para o desenvolvimento de sua prática.
Vinda de uma abordagem teórica e clínica das áreas cognitivas, o incômodo com as limitações desse modo de “ser terapeuta”, mais voltado para as metas do que para os processos, a fizeram perceber que talvez a transformação em terapia não seja apenas sobre mudar os pensamentos, crenças ou emoções em relação a algo. Mas, mais do que isso, mudar os sentidos e significados que damos a esse algo. Ela percebeu que, quando um novo pensamento ou modo de estar no mundo fazia sentido para o cliente, a mudança se tornava possível.
Refletindo sobre minha própria trajetória clínica, percebo e concordo com Grandesso (2000) quando a mesma coloca a importância de uma mudança paradigmática em sua prática: a de que é impossível se ter um conhecimento objetivo da realidade. O terapeuta então, a partir dessa perspectiva, deixa de ser um expert e passa a se tornar um investigador, curioso para entender os sentidos que os clientes atribuem às suas realidades vividas.
A base para essa nova postura se dá, então, no entendimento de que os seres humanos constroem sentidos e dão significado o tempo todo para suas experiências, a partir do espaço relacional entre as pessoas. A linguagem e a criação de narrativas se tornam pontos fundamentais na investigação clínica: quais sentidos o cliente dá para suas experiências? Quem participa da criação desses sentidos? Quais narrativas moldam sua forma de se enxergar no mundo? Como essas mesmas narrativas organizam e/ou restringem suas possibilidades existenciais? Esses são questionamentos que o texto me levou a pensar.
Se as narrativas e os significados são recheados de problemas, como a mudança terapêutica pode acontecer? Grandesso (2000) define que “mudança, no contexto de terapia, implica reconstrução de significados” (p.32), o que significa transformação de um sentido para outro, e que possibilite para o cliente uma forma mais potente e libertadora de se estar no mundo.
Nos diálogos dentro do contexto clínico, terapeuta e cliente formam juntos a responsabilidade pela mudança acontecer. Ninguém é mais importante ou sabe mais do que o outro. Cada um, com sua especialidade e conhecimentos, transformam e são transformados por esses diálogos.
Grandesso (2000) também enfatiza que todo seu estudo e pesquisa foram baseados nas epistemologias pós-modernas construtivistas e construcionistas sociais, levantando os aspectos semelhantes e diferentes entre as duas abordagens, entendendo ambas como complementares ou aditivas entre si. Além disso, um de seus objetivos foi dar maior proximidade entre teoria e prática, compreendendo melhor a hermenêutica do significado e da narrativa no contexto clínico.
Por fim, considero que a autora provoca uma reflexão importante em relação a sua própria postura de terapeuta e pesquisadora: a de que precisamos entender por onde vamos, porque escolhemos esses caminhos, como podemos nos aprimorar e de que forma mantemos uma reflexão crítica sobre nossa prática e as teorias que nos embasam.
GRANDESSO, Marilene. Sobre a reconstrução do significado: uma análise epistemológica e hermenêutica da prática clínica. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2011.
Letícia Oliveira Rodrigues
Aluna Colaboradora da Turma 2024 do Curso de Formação em Terapia Familiar Sistêmica Contemporânea – Psicóloga clínica há 7 anos, formada pela UFU (Universidade Federal de Uberlândia), possui Certificado Internacional em Práticas Colaborativas e Dialógicas, e formações de base teórica pós-moderna e construcionista social.
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