Nucleo Contemporâneo de Psicoterapia

Participação humana: “ser” humano é o primeiro passo para tornar-se humano

Tom Andersen

Texto baseado no artigo “Participação humana: “ser” humano é o primeiro passo para tornar-se humano” de Tom Andersen (2019)

Por Vanessa Pereira de Lima

O artigo “Participação humana: ‘ser’ humano é o primeiro passo para tornar-se humano”, foi escrito por Tom Andersen, professor de psiquiatria social no Instituto de Medicina Comunitária da Universidade de Tromsø, na Noruega. Tom Andersen foi um importante propulsor na iniciativa dos processos reflexivos nas práticas terapêuticas. Ele é o autor de Processos reflexivos, 2002, editado pelo Instituto Noos. Tom morreu na primavera de 2007 e seu artigo foi publicado na Revista Novas Perspectiva Sistêmica em 2019, porém, o texto foi inicialmente publicado como capítulo do livro Collaborative Therapy: Relationships and Conversations that make a Difference em 2007.

 Tom Andersen traz uma série de sentimentos, emoções e percepções que nos constituem desde o nosso nascimento, criando repertório, afetando e sendo afetado na relação com outras pessoas. Nesse encontro, há uma troca mútua entre quem fala, mas também em  quem ouve, tudo isso acontecendo simultaneamente. Isto implica em um jogo do visível e do invisível. O visível estaria no campo das emoções expressas; já o invisível estaria em como somos afetados, no campo da subjetividade, da singularidade e da alteridade como constitutiva do processo terapêutico.

O texto revela que teoria vai além do visível, então, o autor ao invés e usar o termo teoria, se utiliza do termo suposição, compreendendo que as suposições são sempre graus de abertura, uma vez que entre o visível e o invisível, está o sentir, e este só pode ser suposições. Para isso, o uso de metáforas será um aliado para estabelecer um contato entre o visível e o invisível. A visão se torna paradoxal quando ampliamos o sentido de ver, haja vista que o  sentido, muitas vezes vem imbuído das nossas experiências particulares, dos vínculos que carregamos em nossa construção de vida e da maneira que vamos expressá-los ao longo dos encontros que criamos. Os vínculos estão de várias maneiras em nossas vidas, desde um abraço até o silêncio compartilhado. É no vínculo que as relações se estabelecem ou não.

No processo terapêutico, nossa linguagem é como um termômetro que mede o grau de comunicação entre terapeuta e cliente. Quando nos utilizamos de uma linguagem muito próxima da qual o cliente utiliza, pouca coisa acontece, no entanto, se utilizarmos uma conversa incomum demais, corremos o mesmo risco e interrompemos o fluxo da conversa. Então, qual é o meio-termo? A resposta está em sentir o ritmo da conversa, o que comunica e o que não comunica, que tipos de sentimentos estão em cena e o que é efetivo para o cliente e o terapeuta nessa conversação.

Inspirados por autores como: Ludwig Wittgenstein (1953, 1980; Grayling, 1988; Gergen, 1994; Shotter, 1993, 1996; von Wright, 1990, 1994), Lev Vygotsky (Morson, 1986; Shotter, 1993,1996 Vygotsky, 1998), Jacques Derrida (Sampson, 1989), Mikhail Bakhtin (Bakhtin, 1993; Morson 1986; Shotter, 1993, 1996, 2004, 2005) e Harold (Harry) Goolishian (Anderson, 1995), Tom Andersen descreve dez suposições sobre linguagem e significado. Para Tom Andersen, com base em experiências de sua participação em processos reflexivos, o que se sucede são perguntas abertas que expandem o processo terapêutico e o modo de perguntar. Assim, a linguagem é muito mais abrangente e multifacetada, vez que para além da linguagem falada e escrita, há inúmeras outras, entre elas a corporal e emocional que envolve a pintura, dança, riso, choro e fazem parte dos vínculos que criamos no encontro com o outro, isto é, em como criamos significados através das expressões que manifestamos. Essas expressões são movimentos singulares no qual em cada diálogo há uma potência em nutrir tanto o outro como quem fala, pondo em disputa os conceitos de ser e ter como posições estáticas dentro de um mundo em movimento.  

Para concluir, o ato de falar (conteúdo) é uma forma de expressar (diálogo verbal e não verbal). Contudo, o ponto de vista é sempre uma vista do ponto, ou seja, há o lugar subjetivo de quem olha e fala. No processo terapêutico, saber que há uma transversalidade entre cliente e terapeuta é importante, mas não pode ser com julgamentos, juízos de valores ou moralidades. É preciso ouvir o que o cliente quer falar ou não falar e respeitá-lo, seguir suas pistas. O que ele tem a dizer sobre aquele dia? O que ele quer falar e levar para a terapia? É preciso acompanhar a velocidade, mudanças, precipitações, por meio de seu escutar, pensar e falar. Também é preciso estar preparada para lidar com as situações do cliente e não com as do terapeuta, pois ele não é o parâmetro, portanto, não há regras ou respostas prontas. Para isso, uma pista é se colocar curioso, oferecer boas perguntas e ficar atento às aberturas. Fazer boas perguntas que abram questões, não para respondê-las, mas para entrar no processo reflexivo, terapeuta e cliente.

                  

Referência

TOM ANDERSEN. Participação humana: “ser” humano é o primeiro passo para tornar-se humano. Nova Perspectiva Sistémica, n.65, p.7-18, dezembro, 2019.
https://www.revistanps.com.br/nps/article/view/534

 

Vanessa Pereira de Lima

Aluna colaboradora da 4ª turma do Curso de Formação em Terapia Familiar Sistêmica Contemporânea

Psicóloga Social

Doutora em Psicologia Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

Pesquisadora do Grupo de Estudos e Pesquisas Subjetividades e Instituições em Dobras (GEPSID/UERJ)