Nucleo Contemporâneo de Psicoterapia

Utilização de instrumentos reflexivos na formação de terapia familiar

Utilização de instrumentos reflexivos na formação de terapia familiar: “cadernos de viagem” e equipe reflexiva


Viviam Ajala Pasini- CRP05/67193

Na presente resenha, vamos falar sobre a formação do terapeuta de família sistêmico, para isso o artigo utilizado será o escrito por Vania Curi Yazbek, publicado em 2021, pela revista nova perspectiva sistêmica “UTILIZAÇÃO DE INSTRUMENTOS REFLEXIVOS NA FORMAÇÃO DE TERAPIA FAMILIAR: “CADERNOS DE VIAGEM” E EQUIPE REFLEXIVA”. Mas vale destacar que esse artigo foi publicado pela NPS n. 8, em maio de 1996, no Rio de Janeiro, com o título original “Utilização de instrumentos reflexivos na formação “cadernos de viagem” e equipe reflexiva”. Nesse artigo a autora expõem modificações no contexto de formação, ou seja, da aprendizagem e o desenvolvimento de instrumentos reflexivos, o que ela denominou de “caderno de viagem”, como um facilitador da postura reflexiva. 

Segundo Yazbek (2021), a formação do terapeuta sistêmico é um processo complexo, resultante do entrelaçamento contínuo e recursivo entre o conhecimento de teorias e práticas, a vivência desse conhecer e a construção de um estilo próprio de atuar como terapeuta. A autora, afirma que faz parte dos terapeutas sistêmicos que adotam uma postura co-construtivistas e construcionista social, essa postura caracteriza-se pela crença no observador participante na construção da realidade, no papel construtivo do conhecimento e da linguagem, e na auto-referência e reflexividade presente na construção do conhecimento. 

Nesse sentido, a partir da crença na construção social da realidade, desdobra-se a adoção da conversação dialógica como metáfora central da terapia, adotando características de multiverso e transparência, retificando a noção de autoridade e de interação instrutiva, tornando um espaço interessado na criatividade, na emergência de novas possibilidades narrativas e na construção de recursos (Schnitman & Fuks, 1994 apud Yazbek, 2021). 

Para isso, a autora (2021, p.8) traz no texto, alguns questionamentos sobre a formação do terapeuta: “Como operar na transmissão do saber se o profissional no lugar de docente é ao mesmo tempo participante desse conhecer? Que postura ética e de responsabilidade se faz necessária nesse processo? Como se constrói um sistema de interação de ensino-aprendizagem onde a curiosidade se mantenha e onde o professor ocupe o mesmo lugar de “não saber” do terapeuta? Como pensar ensino-aprendizagem abandonando a noção de “interação instrutiva”? A partir da opção do corpo docente por

uma postura determinada, como oferecer um panorama multiverso da terapia familiar constituído pelos diferentes modelos baseados em outras bifurcações teóricas do campo?” No artigo, é reforçada a ideia de que a terapia familiar surge das mudanças dos sistemas de crenças científicas e políticas da modernidade, surge de uma revolução paradigmática produzida pela introdução de conceitos sistêmicos e cibernéticos no campo das ciências sociais (Schnitman & Fuks, 1994 apud Yazbek, 2021). 

Segundo a autora, outras questões são levantadas frente à interação com diferentes modelos da prática clínica que surgiram no campo da terapia familiar e consequentemente a identidade da terapeuta familiar se estrutura, se nutre e se desenvolve através da mudança, gerando múltiplos modelos práticos de intervenção terapêutica, que são complexos e exigem dos organizadores. As implicações multidimensionais do contexto de formação, por coerência teórica, embora a terapia e formação sejam processos distintos, são campos entrelaçados. 

“A adoção da postura coconstrutivista e construcionista social como 

marco teórico-prático para o contexto terapêutico nos obrigou a revisar 

o contexto em que operamos como formadores de terapeutas. Como 

construtores das realidades que vivemos, reconstruímos nossas 

metáforas do ensino-aprendizagem e nossos instrumentos para 

ensino-aprendizagem da mudança.” (Yazbek, 2021, p.9). 

A autora em seu artigo, busca o conceito de reflexão e as reflexões de Tom Andersen (1994), e o conceito da ecologia da ação na epistemologia da complexidade de Edgard Morin (1994), como instrumentos buscou a equipe reflexiva também de Tom Andersen (1994) e o diário de bordo de Dora Schnitman e Saul Fuks (1993). Desse modo, a interpretação desses conceitos e instrumentos, segundo a autora, gerou uma construção de um desenho específico, um contexto colaborativo, no qual, a metáfora central é a conversação dialógica, um diálogo de diálogos, um diálogo externo de diálogos internos. 

Yazbek (2021) afirma que uma postura reflexiva possibilita a reformulação de respostas automáticas, no processo de investigação gera um movimento intrasubjetivo que permite a emergência de novas construções da realidade. Para isso, o instrumento facilitador do posicionamento reflexivo é o uso do “caderno de viagem”. 

O instrumento se dá a partir do pedido para que os alunos registrem, ao longo do curso, suas reflexões frente aos textos lidos, ouvidos e falados e que registrem as reflexões que possam surgir da interação grupal com os colegas, com os professores e com os pacientes. Em momentos específicos é proposto um espaço conversacional para a troca desses registros. É utilizado o formato da equipe reflexiva, onde os alunos são divididos em

grupos e compartilham suas reflexões, e em um segundo momento, os professores conversam entre si, na frente dos alunos, levando perguntas a partir do que ouviram. Estas perguntas desconstrutivas/construtivas auxiliam na exploração de perspectivas alternativas e de outras possibilidades de narrativas. 

“A prática do “caderno de viagem” desenvolve a postura reflexiva na 

medida em que dirige a atenção de cada um para o próprio processo de 

ensino-aprendizagem; oferece uma oportunidade de utilizá-la em contexto 

grupal, uma vez que o ato de compartilhar os registros exige uma 

decisão sobre o que pertence a um domínio privado, útil apenas para 

si próprio, e o que deseja verbalizar socialmente para poder também 

ajudar o outro; e cria um contexto conversacional dialógico que 

possibilita a transformação do campo de trabalho em um contexto 

aberto ao operar na incerteza e na dúvida, passível de mudanças 

individuais e grupais.” (Yazbek, 2021, p. 10). 

Por fim, a proposta busca construir um espaço de interação na formação, sendo um instrumento facilitador de conforto à medida que organiza as pautas de interação entre os alunos e professores e também entre os sistemas de crenças pessoais e o conhecimentos de novos sistemas de crenças e teorias propostas pelo objeto de estudo. Nesse sentido, a autora não pretende construir uma proposta modelo de curso e formação, e sim construir um relato da experiência no qual a reflexão é o pilar principal. 

Palavras-chave: instrumentos, terapia familiar, reflexão, formação 

Referência 

YAZBEK, V. C. Utilização de instrumentos reflexivos na formação de Terapia Familiar:: “cadernos de viagem” e equipe reflexiva. Nova Perspectiva Sistêmica, [S. l.], v. 30, n. 70, p. 6–12, 2021. DOI: 10.38034/nps.v30i70.647. Disponível em: https://revistanps.com.br/nps/article/view/647. Acesso em: 22 dez. 2022.